domingo, 10 de maio de 2009

O reflexo

Em geral, as cidades se parecem com as pessoas que nelas habitam, carentes de espaços recreativos, cheias demais de informação e fumaça.



Aquela tarde saí mais cedo do restaurante, sexta feira as 18 horas, pensei que o metrô estaria bem cheio, a chuva tinha parado e decidi tomar um café, entrei no bar antigo de teto alto, e paredes de mármore quase branco, escolhi a pequena mesa que eu tanto gosto e nunca acho livre do lado da grande janela.

Olhei pelo vidro ainda molhado um rio de gente indo não sei onde e tive por um instante a sensação de estar numa bolha onde o tempo tem outra densidade, desci o olhar para a pequena xícara tão cheia de si mesma que dava pena despoja-la de seu amargo elixir.

Enquanto dissolvia o cubinho de açúcar lentamente como num ritual japonês, ergui a cabeça para continuar observando a rua, mas, no momento antes de ajustar o foco, dei de cara com um reflexo que parecia me observar indiscretamente. Tinha meus olhos, mas com outro olhar. Estava ali como um turista do espírito me desarmando, tinha sido pego com a guarda baixa e não tive outra que sorrir. Me entreguei a esses olhos como aos de um amante e quis esse homem como a um filho no que durou esse instante com a frescura do alheio e a consciência do próprio, sem tempo suficiente para o juizo.

Aquela visão durou o tempo de dois latidos e subitamente a pessoa no reflexo da janela voltou a ser eu, tão cheio de mim como aquela xícara de café e o metrô de gente cansada

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segunda-feira, 4 de maio de 2009